segunda-feira, 25 de agosto de 2008

RESGATANDO NOSSA HISTÓRIA I


Diocese do Recife: 30 Anos - Os Antecedentes: Os Ingleses

Descontando as breves presenças francesas e holandesas no Brasil Colônia, o Protestantismo de Imigração deitará raízes no período do Brasil Monárquico, primeiro os ingleses, e, logo a seguir, os alemães. Estes, mais numerosos, vinham para ficar, e eram, em sua grande maioria agricultores, fixando-se em zonas rurais do sul e do sudeste. O pioneirismo inglês seria urbano, costeiro, voltado para a indústria e o serviço, quando a hegemonia do Reino Unido nos campos da economia e da tecnologia (as artes, literatura e filosofia eram de matriz francesas) se mantém no Brasil desde o Tratado de Comércio e Navegação, de 1810 (com a vinda da família real para o Brasil fomos elevado ao status de Reino Unido de Portugal e Algarves) até o pós-Segunda Guerra Mundial, quando, com a bi-polaridade das superpotências e a “guerra fria” , os Estados Unidos da América começa a substituir as influências inglesa e francesa. Vale lembrar que durante o século XIX, a “Era Vitoriana”, a Grã-Bretanha chegou a ter o maior Império registrado na História (um quarto do território terrestre e um quinto da sua população), tendo que abrir centenas de Capelanias Anglicanas em todo o mundo, por iniciativa do governo, além da presença de missionários junto aos nativos, apoiados por Sociedades Missionárias Anglicanas privadas.
O setor de exportação-importação, metalurgia, transportes (trens, bondes e navios), energia (gás e eletricidade) e comunicação (telefone e telégrafo) eram de propriedades inglesas, que, ainda investem no setor bancário e em outros ramos comerciais e de mineração. Numerosas colônias de cidadãos britânicos se estabelecem em nossos principais centros urbanos. Pelo Tratado, eles poderiam – além de clubes e cemitérios – construir templos para o culto anglicano, desde que celebrado em língua inglesa, e que as construções não tivessem símbolos religiosos exteriores. A partir do Rio de Janeiro, esses templos foram construídos, também, em Niterói, São Paulo, Santos, Nova Lima (MG), Salvador, Recife, e, muito posteriormente, em Belém (PA). A jurisdição episcopal era do Bispo de Londres, que ocasionalmente usava bispos em visita ao nosso continente (como o do Havaí, em 1869). Mas em 1874, a Igreja da Inglaterra, a pedido do Ministério das Relações Exteriores, instala a Diocese das Ilhas Falkland (Malvinas), com a Catedral em Port Stanley e escritório em Buenos Aires , com jurisdição sobre toda a América do Sul.
No Recife, passamos a ter o Town Club (um bar no bairro do Recife), o Clube Caxangá, o Country Club, o Cemitério (no bairro de Santo Amaro) e o templo da Holy Trinity Church e casa pastoral, ambos no bairro da Boa Vista. A comunidade inglesa, por causa da amenidade do clima, preferia residir na área Parnamirim – Casa Forte – Apipucos – Monteiro.
A Capelania Britânica de Pernambuco teve início no ano da nossa Independência, 1822, tendo como seu primeiro titular o Rev. John Penny , seguido do Rev. Charles Adye Austin , que construirá o templo, a partir de 1838, na Rua da Aurora, esquina com a então Rua Formosa, onde hoje se encontra o Cinema São Luís. A casa pastoral ficava em uma transversal da Rua Formosa, denominado, por isso mesmo de “Beco do Padre Inglês” (o ministro anglicano), posteriormente Rua do Padre Inglês (hoje dominada pelos batistas...).
Estão registrados os seguintes Capelães que aqui serviram: Rev. J. Midgley (1874-1892), Rev. William Ding (que morre de febre amarela e é aqui sepultado), Rev. W.E. Macray (1893-1918), Rev. F.M. Lane (1900-1902), Rev. George Baile (1903-1918, que morre nos campos de batalha da Primeira Guerra Mundial, integrando o contingente de voluntários anglo-pernambucanos), Rev. J. Meredith Bate (1920-1922), Rev. Archbald Nocol (1922-1936), Rev. H.J. Dobb (1940-1941). Sem registro preciso das datas de seus períodos, seguem-se os reverendos: Eric C. Wilcokson, J. Gould, D.N. Jackson. Theodore Hina, Cecil R. Burton, R.F. Pearce e John Ellsworth (início dos anos 1960, quando o conheci e a Igreja, ainda com alta freqüência de ingleses e de seus descendentes).
Quando, em 1944, a Prefeitura do Recife resolveu alargar a Rua Formosa, transformando-a em Av. Conde da Boa Vista, foi desapropriado o terreno do antigo templo dos ingleses. Estes compraram um outro no quintal do Country Club, na Rua da Matinha (depois Carneiro Vilela), onde edificaram outro templo, aproveitando móveis, utensílios, o gradil e os vitrais do templo antigo. Ali foi posto o primeiro órgão de tubos de todo norte e nordeste do Brasil.
O último Capelão inglês (meu amigo, discipulador, assessor da ABU, professor dos Seminários Congregacional, Batista e Presbiteriano), o inglês Dionísio (Dennis George) Pape era, na realidade, um Batista, feito Ministro Leigo para oficiar orações matutinas e funções pastorais não-sacramentais, pelo Bispo Sherrill . Foi o Rev. Pape quem me deu o meu Primeiro LOC (Livro de Oração Comum), edição de 1930, da então Igreja Episcopal Brasileira, que uso e conservo com carinho até hoje.
As Capelanias Britânicas eram fechadas, atendendo apenas os estrangeiros, e não tinham nenhuma motivação missionária junto aos brasileiros ( “Eles já têm a religião deles...” ). Diziam, criticamente, os integrantes do protestantismo de missões (que tem início, em1855, com os congregacionais): “Os ingleses deixam na Inglaterra o seu capote (sobretudo) e a sua Bíblia” . A Capelania do Recife atendia os ingleses de todo o Nordeste, realizando, ocasionalmente, cultos em outras cidades. Um número reduzido de brasileiros se tornou anglicano por casamento, ou por terem conhecido a nossa igreja em visitas de estudo ou de trabalho à Inglaterra. Por outro lado, é inegável que os ingleses deixaram inestimável contribuição cultural e tecnológica para o nosso País, e fixaram a imagem do Anglicanismo como um ramo histórico, reformado e respeitável da Igreja de Jesus Cristo (altas autoridades da Corte Imperial estiveram presentes à inauguração do templo do Rio de Janeiro, protegido pela Polícia, ante a ameaça de apedrejamento de parte de um quitandeiro português...).
Com o fim do Império Britânico e a nova hegemonia dos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial (anos 1940 e 1950) – quando tivemos lutando, também, um contingente de anglo-pernambucanos – a maioria dos ingleses aqui residentes foram voltando para a Grã-Bretanha, outros foram morrendo ou estavam demasiado idosos, outros se tornaram Católicos Romanos por casamento, ou se secularizaram, iniciando o declínio das Capelanias.
A Igreja Episcopal Brasileira, nos anos 1960, estava marchando para ser uma Província Autônoma da Comunhão Anglicana, e inicia gestões diplomáticas para integrá-las, bem como as Capelanias Japonesas (São Paulo e Paraná) à nascente Província. Esse trabalho foi feito por Dom Edmund Knox Sherrill , Bispo da Diocese do Brasil Central, com sede no Rio de Janeiro, e com jurisdição do Paraná à Amazônia. Progressivamente, todas as Capelanias foram mudando de jurisdição, e se integrando à Província brasileira, com exceção (até os nossos dias) da Christ Church (Rua Real Grandeza, Botafogo) no Rio de Janeiro.
Uma assembléia paroquial da Capelania do Recife, Holy Trinity Church, decidiu por essa filiação, enviando como delegada ao Concílio da Diocese do Brasil Central a Sra. Conti . A IEB ficava com o compromisso de assistir os súditos de Sua Majestade, residentes ou de passagem, em suas necessidades religiosas. Cultos em Inglês (por fim apenas uma vez por mês) aconteciam até o início da década de 1990, bem como o Culto Memorial, no dia de Finados, celebrado no Cemitério dos Ingleses. Nesse período de transição serviram no Recife dois norte-americanos: os reverendos John Said (depois Bispo Sufragâneo em Miami) e Phillip Getchell , até 1975 (que inicia a evangelização de crianças pobres da comunidade de Brasilit apanhadoras de bola de Golfe no Clube Caxangá, realizando estudos bíblicos informais embaixo das árvores).
O trabalho de evangelização para brasileiros, em língua portuguesa, tem como pioneiro, em 1966, o Rev. Alfredo Rocha da Fonseca Filho , pernambucano de origem presbiteriana, formado no Seminário de Porto Alegre. Embora membro da Igreja Luterana (IELB) acolitei o seu primeiro culto e o culto da primeira visitação episcopal. Simpático, dinâmico, comunicativo, o Rev. Alfredo divulgou o Anglicanismo em nossa sociedade, fez amizades na imprensa, realizou o primeiro ato ecumênico, de Páscoa, no Country Club (que tinha os clérigos anglicanos como sócio-honorários), com o Padre da Matriz do Espinheiro e o Pastor da Igreja Presbiteriana da Encruzilhada, promoveu Conferências e Concertos de órgão de tubo (aqui trazendo o grande orador e músico Rev. José Del Nero ). Nessa época havia dois cultos dominicais: um em inglês e um em português. Um grupo expressivo pioneiro de confirmandos brasileiros foi deixado pelo Rev. Alfredo , que teve de fugir do Recife perseguido pela ditadura militar, por dar assistência pastoral aos presos políticos da Casa de Detenção. Foi substituído pelo Diácono Rev. Paulo Medeiros (1968-1969), carioca de origem Batista, que deixou o ministério e se tornou conhecido psicanalista no Recife.
Em março de 1975 é designado como Pároco o Rev. Paulo Ruiz Garcia , paulista de origem presbiteriana. Em 20 de maio de 1976 encerra-se, definitivamente, o Ciclo da Capelania Britânica, com a criação, pelo Sínodo Geral da agora Igreja Episcopal do Brasil, da Diocese Setentrional, com sede no Recife, desmembrada da Diocese Central, com jurisdição sobre todo o Norte e o Nordeste, sendo designado Bispo o Revmo. Dom Edmund Knox Sherrill , norte-americano, que passaria a aqui residir em 1977, até janeiro de 1986 (continua).

(Compilação Histórica:
Revmo. Dom Robinson Cavalcanti )

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